sábado, 12 de outubro de 2013

Carta aberta à Fran

Cara Fran, 
Olha só que legal, vi um vídeo e vários comentários sobre o seu caso hoje.
No mais gostaria de agradecer a possibilidade que me deu, incontestavelmente de falar abertamente sobre isso com meus alunos. Eis o motivo no qual estou publicando essa postagem em meu blog aberto a classe estudantil e pensante. Sou professora e monitora, e não há momento mais propicio do que este para sanar a questão privada no qual estava inserida você e seu namorado/parceiro/amigo/conjugue/amante/puta que pariu.

É Fran, acontece que não só eu, como grande parte das mulheres, pasmem 73% sente uma pequena tara sexual em ser filmada/fotografada, assim como tantas outras porcentagens sentem taras por brinquedos, vibradores, e demais fantasias sexuais. Sim, sexo é uma coisa casual. E como todos SABEM E FAZEM, não passa de uma atividade meramente humana.

Fato é que as pessoas muitas vezes ao analisarem uma situação, pensam a principio na vítima, depois nas consequências e por ultimo sobre quem praticou o ato, pois é assim que funciona a roldana do determinismo natural.

Dentro de uma relação privada entre vocês, vamos falar da mesma que se tornou publica de uns dias pra cá. Não pense que quero dar proporção ao caso, mas fazer disso uma questão que interesse não só aos meus alunos que estão na fase de transição de conhecimento, como numa comunidade em geral, inclusive aos pais que não devem ensinar seus filhos a como não fazer sexo e sim cautelar sobre as más índoles que todas nós estamos suscetíveis a passar por isso.

Acredito como professora, que o maior erro que nós cometemos é querer ir além das nossas limitações, é claro que as condições ilimitadas trazem consequências, assim como a proibição também traz, quando não acompanhadas de um critério. E o critério de todas essas “ilimitações” masculinas vem acompanhada de um machismo determinante em que o homem só fez aquilo que foi permitido, não importa se foi com consentimento ou não, nós estamos sempre erradas a partir do momento em que tiramos a roupa. Já que não temos o direito de confiar ou nos sentir a vontade, ou mesmo se queremos dar, sinta-se no direito assim como eu faço agora, de se libertar. Eu quero transar seja lá com quem for porque eu sou ilimitada, eu nasci livre, mas dentro da minha liberdade entre as paredes do bom caráter, me esqueço que o livre-arbítrio alheio muitas vezes não passa de uma carapuça fina, que a sociedade insiste em usar.

Entremos na questão que sofremos em horas. Penso que devo prestar toda a minha solidariedade fazendo esta carta aberta e honesta. Já fui chamada de puta por transar com mulheres apenas para adquirir experiência, quando decidi trabalhar fora cedo, quando usei short no ônibus, quando decidi ter um relacionamento aberto, Quando estava cansada demais para transar com algum ex namorado babaca, enfim, quando decidi me tornar uma mulher sexualmente livre sem pensar nas consequências que não eu traria, mas o machismo.

Dentro dessas condições no qual estamos expostas o tempo todo, rogo para que o seu caso vire uma questão de justiça e não de julgamentos precários e de pouca formação ideológica dessa população vítima de uma sociedade patriarcal. Não sinta raiva dessas pessoas, sinta pena, não de você que tem uma vida sexualmente ativa (diferente de quem fala pelos cotovelos), sendo machista por hora aqui hehe, afinal de contas isso infere a sua particularidade e liberdade simultaneamente, não deixe isso passar como um vão. Sei que você não é “uma mulher imoral”, é apenas como um todo, uma jovem livre, acabe com tudo isso e enfrente o que vier pela frente defendendo a sua liberdade que já nasceu com você.

Um abraço.


Att. Respeito

segunda-feira, 19 de agosto de 2013

Álvares de Azevedo: O virgem de 21 anos



Trecho baseado na pesquisa "Do Romance ao Simbolismo: Uma abordagem comparativista."

A mulher romântica, assim como a simbólica é alva, branca na maioria das representações lascivas dos poetas. Porém, a mulher romântica é sempre o anjo, a sereia, é essa incessante busca pelo irreal, enquanto a mulher simbólica é tanto representada com uma atmosfera bíblica, quanto em uma forma orgânica e carnal. Cruz e Sousa foi especialista na utilização de imagens ousadas com efeito de sugestão. Angústia sexual e erotismo misturam-se em toda sua extensão poética. Observe a exaltação de uma mulher que parece devorar os homens no poema “Lubricidade” da obra “Broqueis”.

Lubricidade
Quisera ser a serpe venenosa 
Que dá-te medo e dá-te pesadelos 
Para envolverem, ó Flor maravilhosa, 
Nos flavos turbilhões dos teus cabelos.
Quisera ser a serpe veludosa 
Para, enroscada em múltiplos novelos, 
Saltar-te aos seios de fluidez cheirosa 
E babujá-los e depois mordê-los...

Talvez que o sangue impuro e flamejante 
Do teu lânguido corpo de bacante, 
Da langue ondulação de águas do Reno

Estranhamente se purificasse... 
Pois que um veneno de áspide vorace 
Deve ser morto com igual veneno...

(SOUSA, Cruz. Broqueis, pág. 30)


A grande tentação do homem branco é a mulher de cor. Percebemos que ao longo de sua obra, há inexoravelmente uma luta de oposição, desde o homem negro com a cultura do branco, o ideal amoroso da mulher branca, do erotismo negro. A temática do feminismo na obra de Cruz e Sousa, vem ao encontro do seu desejo de eternidade, de criação e de beleza medieval evocadora. A mulher branca é sacralizada, portadora do mistério, como se verifica excerto do poema:

“Alva, do alvor das límpidas geleiras,
Desta ressumbra candidez de aromas...
Parece andar em nichos e redomas
De Virgens medievais que foram freiras.”


Virgem medieval, da pureza intocável, o poeta mostra esse conflito interno em não poder tocar a mulher branca, objeto do seu desejo. O eu lírico, então vislumbra a mulher em seu desejo carnal que causa incômodos, geleiras, e talvez uma repressão sexual e intima do poeta.
No poema “Alda”, a musa está salva do vício “amortalhado na pureza clara”, indicando a negação total do corpo e desejo carnal do poeta. Conta-se a necessidade de transceder e espiritualizar a musa e que ao mesmo tempo apontam para o oposto; a imagem da luxúria.

Alva, do alvor das límpidas geleiras,
Desta ressumbra candidez de aromas...
Parece andar em nichos e redomas
De Virgens medievais que foram freiras.

Alta, feita no talhe das palmeiras,
A coma de ouro, com o cetim das comas,
Branco esplendor de faces e de pomas
Lembra ter asas e asas condoreiras.

Pássaros, astros, cânticos, incensos
Formam-lhe aureoles, sóis, nimbos imensos
Em torno a carne virginal e rara.

Alda fez meditar nas monjas alvas,
Salvas do Vicio e do Pecado salvas,
Amortalhadas na pureza clara.
(Alda, Cruz e Sousa)

Há um drama psíquico, entre o plano material e imaterial na intimidade do poeta. Em “Dança do Ventre”, o poeta delineai a mulher como sendo pecaminosa, cujo corpo é a forma inferior, o que causa uma certa eloqüência ao despertar o desejo terrestre ao associar a mulher com um réptil em seu plano amoroso:

Torva, febril, torcicolosamente, 
numa espiral de elétricos volteios, 
na cabeça, nos olhos e nos seios 
fluíam-lhe os venenos da serpente. 

Ah! que agonia tenebrosa e ardente! 
que convulsões, que lúbricos anseios, 
quanta volúpia e quantos bamboleios, 
que brusco e horrível sensualismo quente. 

O ventre, em pinchos, empinava todo 
como réptil abjecto sobre o lodo, 
espolinhando e retorcido em fúria. 

Era a dança macabra e multiforme 
de um verme estranho, colossal, enorme, 
do demônio sangrento da luxúria!
( SOUSA, Cruz. Faróis, “Dança do Ventre”.)
 

Álvares de Azevedo, mesmo descrevendo intimamente a mulher, sempre a eleva ao título de virgem.  Em sua poesia o sentimentalismo é exaltado, e a mulher é paradoxalmente vista como o ideal de pureza conjugado com a fonte de prazer carnal, ainda que pelo beijo e não pelo ato sexual, uma vez que o ideal de pureza está relacionado à virgindade. É verídico afirmar que o poeta amou e muito, mas devido a ausência de uma mulher “real” que o correspondesse, esse plano ficou sempre na coexistência. Nisso, a lírica do Poeta se aproxima muito da lírica de Cruz e Sousa; retratando a mulher alva e intocável, as perfeições inalcançáveis de um poeta que morreu tão vigem quanto nasceu. Observa-se a imagem do poeta que lamenta a virgindade;

“Oh! ter vinte anos sem gozar de leve
A ventura de uma alma de donzela!
E sem na vida ter sentido nunca
Na suave atração de um róseo corpo
Meus olhos turvos se fechar de gozo!
Oh! nos meus sonhos, pelas noites minhas
Passam tantas visões sobre meu peito!
Palor de febre meu semblante cobre,
Bate meu coração com tanto fogo!
Um doce nome os lábios meus suspiram,
Um nome de mulher... e vejo lânguida
No véu suave de amorosas sombras
Seminua, abatida, a mão no seio,
Perfumada visão romper a nuvem,
Sentar-se junto a mim, nas minhas pálpebras
O alento fresco e leve como a vida
Passar delicioso... Que delírios!
Acordo palpitante... inda a procuro;
Embalde a chamo, embalde as minhas lágrimas
Banham meus olhos, e suspiro e gemo...
Imploro uma ilusão... tudo é silêncio!
Só o leito deserto, a sala muda!
Amorosa visão, mulher dos sonhos,
Eu sou tão infeliz, eu sofro tanto!
Nunca virás iluminar meu peito
Com um raio de luz desses teus olhos?”
(Idéias intimas – Álvares de Azevedo)


Mário de Andrade, incontestavelmente descreve o poeta com pequenas aventuras amorosas. O poeta tinha um certo retrocesso sexual. Essa transferência de prazer físico para os sonhos é própria dos sexualmente insatisfeitos, principalmente jovens. Onde Mário de Andrade foi encontrar a “fobia”, Silvio Romero viu a ausência, e podemos observar que se conclui na “Lira dos Vinte anos”, um anjo e um demônio misturados nos desejos físicos do poeta que se encontram no plano carnal e irreal.
As fantasias eróticas do poema “Idéias íntimas”, estão diretamente vinculadas ao conceito de masturbação:

“(...)No véu suave de amorosas sombras
Seminua, abatida, a mão no seio,
Perfumada visão romper a nuvem,
Sentar-se junto a mim, nas minhas pálpebras
O alento fresco e leve como a vida
Passar delicioso... Que delírios!(...)”


Através dos sonhos sem dormir, sonhos como sinônimo de devaneios e fantasias, em primeiro estágio, e dos sonhos dormindo, o poeta vivia os seus desejo eróticos, que eram povoados de imagens lúbricas e sensuais, fortemente excitantes. Descobre-se uma forte tendência sexual do poeta e até mesmo um sentimento de culpa, quase sempre inseparável da masturbação. Dentro desse contexto, vê-se um poeta movido pelos impulsos e fantasistas arbitrários, tentando viver a imagem da mulher, colocando nos lábios dela, no corpo frio embalsamado, em delírio tremendo e suspirando.
Enquanto isso, Cruz e Sousa manifesta sua apreciação pela brancura, sinônimo de pureza de religiosidade, aproximando paralelamente da mulher inalcançável, intocável pelo fato do preconceito racial vivido pelo poeta em sua sociedade na época. Uma vez que a mulher se encontra distante do poeta Romântico pela sua real incompatibilidade carnal, a mulher do Simbolista se distancia em especificidade de Cruz e Sousa pela raça, pela incompatibilidade social do poeta frente a uma sociedade ainda racista.

Do léxico de Cruz e Sousa, especialmente o dos primeiros livros, já se disse que, além da presença explicável de termos litúrgicos, traía a obsessão do branco, fator comum a tantas de suas metáforas em que entram o lírio e a neve, a lua e o linho, a espuma e a névoa. Ao que se pode acrescer a não menor freqüência de objetos luminosos ou translúcidos: o sol, as estrelas, o ouro, os cristais. À explicação um tanto simplista dos que viram nessa constante apenas o reverso da cor do poeta, um intérprete mais profundo, o sociólogo Roger Bastide, preferiu outra, dinâmica, pela qual todas as barreiras exitenciais da vida de Cruz e Sousa – e não só a cor – o levaram a um esforço de superação e de cristalização, fazendo-o percorrer um caminho inverso ao de Mallarmé” (BOSI, 2006, p. 274)


[...]Talvez a explicação para o fato de Cruz e Sousa descrever e idealizar a mulher branca esteja no fato de que ele teve uma educação de fundo germânico,impregnada de Haeckel, Büchner e Schopenhauer [...] (COUTINHO, 2004, p. 405).Também pode estar no fato de ele ter “amado uma Vênus loira, nórdica, que realmente existiu, e que era uma pianista” (Idem, ibidem, p.403). 


A musa de “Seraphica” é representada como bela e virginal, portanto pura, dura e fria por um lado, mas com a suavidade dos anjos e das flores por outro. Podemos deduzir isso devido ao fato de a maioria dos adjetivos que a caracterizam se encontrarem especialmente no espaço simbólico das pedras, das flores, da morte e do sagrado cristão, aí se encontra paralelamente a musa de Álvares de Azevedo, onde a mesma se encontra fria, pálida e reclinada:

Pálida à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!


Era a virgem do mar, na escuma fria
Pela maré das águas embalada!
Era um anjo entre nuvens d’alvorada
Que em sonhos se banhava e se esquecia!

Era mais bela! o seio palpitando
Negros olhos as pálpebras abrindo
Formas nuas no leito resvalando


Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti – as noites eu velei, chorando,
Por ti – nos sonhos morrerei sorrindo!
(AZEVEDO, Álvares de. Lira dos vinte anos. Porto Alegre: L& PM, 1998. p.190-191)


O poeta oscila entre a pura contemplação e a possibilidade de concretização da relação amorosa.
Romanticamente o poema leva a crer que é através do sonho que existe a melhor oportunidade para a realização carnal do amor. É possível perceber uma certa antecipação da estética realista-naturalista na descrição do corpo da mulher. Quando vista de uma forma negativa, a mulher na forma intrínseca do poeta, representa a culpa carnal, a transmutação do desejo figurado ao plano real, o plano terrestre.

" És a origem do Mal,
és a nervosa serpente tentadora e tenebrosa,
tenebrosa serpente de cabelos!... "


Quando nos debruçamos sobre o poema “Tenebrosa” de Cruz e Sousa, o primeiro aspecto que chama a atenção já a partir do título é a representação aparentemente negativa da mulher de cor negra, representação em que predominam adjetivos e comparações provenientes de campos semânticos e simbólicos da luta, do prazer carnal e da animalidade, " És a origem do Mal, és a nervosa serpente tentadora e tenebrosa, tenebrosa serpente de cabelos!... "

No trecho do Poema da primeira parte da Lira dos vinte anos, pode-se observar, ainda que bastante oculto, uma visão venenosa, atrativa voltada para atmosfera sexual, tratada pelo satanismo, um certo desconforto por parte do poeta em querer compactuar com esse desejo terrestre, a dor que isso causa, a convulsa pela mulher idealizada semelhante à mulher de Cruz e Sousa:

Amoroso palor meu rosto inunda,
Mórbida languidez me banha os olhos,
Ardem sem sono as pálpebras doridas,
Convulsivo tremor meu corpo vibra...
Quanto sofro por ti! Nas longas noites
Adoeço de amor e de desejos...
E nos meus sonhos desmaiando passa
A imagem voluptuosa da ventura:
Eu sinto-a de paixão encher a brisa,
Embalsamar a noite e o céu sem nuvens;
E ela mesma suave descorando
Os alvacentos véus soltar do colo,
Cheirosas flores desparzir sorrindo
Da mágica cintura.
Sinto na fronte pétalas de flores,
Sinto-as nos lábios e de amor suspiro...
Mas flores e perfumes embriagam...
E no fogo da febre, e em meu delírio
Embebem na minh’alma enamorada
Delicioso veneno.
(AZEVEDO, Alvars de; Lira dos vinte anos – Itália II)


Em uma tradição cristã, o satanismo está associado ao paganismo através do Deus Pã que é um Deus venerado como força fecundante da natureza. Meio homem, meio animal que tem o dorso e rosto de homem, mas ostenta chifres e patas de bode, com longos pelos cobrindo o corpo e feições animalescas. A parte animalesca sendo assim representada pelo rabo e pelas patas, mostra como o homem está sujeito às tentações carnais. A mulher como símbolo do pecado é a representação perfeita daquilo que podemos chamar de culto culposo a Eva por ter entregado o paraíso ao cair na tentação de Satã. Por uma questão lendária e cultural, a mulher veio sendo representada como o cerne dos problemas mundanos, o perigo, o abismo profano no qual todos meros mortais estão sujeitos. Fazendo uma pequena análise física da carta de Tarô de Marselha, podemos concluir essa associação, deixando claro que a carta denominada “diabo”, carrega o consciente confuso, curioso, tentado. O Deus Pã, nomeado como Diabo acorrentando um homem e uma mulher nus, a representação de Adão e Eva é possível, relacionando simbolicamente o ímpeto e a libertinagem interligados ao mal, o sexo e o desejo sendo objetos dominante.


Ainda que idealizada em plano irreal, a musa inspiradora, a virgem do seio rosado, a inspiração pela musa clássica dos padrões europeus, a mulher esteve sempre presente representando os dois lados da moeda: Se por um era o anjo etéreo virginal dos campos, por outro era a personificação do mal, do veneno, a tradição pecaminosa. Aquilo que trai o poeta, que o faz ceder à idéia que se torna carnal. Uma das vertentes que mais definem essa familiaridade entre Cruz e Sousa e Álvares de Azevedo e muitas outras categorias é a antítese sempre paralela e metapoética, Aquilo que é inalcançável, a eterna busca pela realização plena e estática do ser humano fez com que esses autores no auge de sua época retratarem a mulher como símbolo e possibilidade de fuga do mundo que se vê enquadrado na decadência orgânica, no próprio questionamento e conflito interno do poeta que não se encontra na formalidade e na sua função. Eis um plano real e um fato presente na vida destes dois poetas; o conflito existencial.


Por: Valesca Rennó



Elementos pré simbolistas no contexto ultra romântico








Caminhando para uma estrutura musical, os poetas da década de 80, buscavam se afastar das escolas literárias parnasianas e realistas. Embora os artistas simbolistas tenham algumas características em comum, muitos deles não aderiram a nenhuma uniformidade estilística.

Veremos o sentimento religioso, o desejo de religação com o cosmos, mesclado à angústia de viver nesse miserável plano de existência. Porém, as razões sócio-econômicas que engendram a realidade insatisfatória são deixadas de lado preservando o platonismo e o cristianismo. Melancolia sem revolta, eis o que, grosso modo, é apresentado como essencial da poesia  Simbolista,.

Podemos dizer que o Simbolismo por um lado representa a versão final da evolução iniciada com o Romantismo, com a descoberta da metáfora e que conduziu uma riqueza imaginária impressionista. Porém, ele também pode ser considerado como uma reação contra toda a poesia anterior. Fato este, que o próprio Simbolismo repudia o Romantismo pelo seu emocionalismo e o convencionalismo da linguagem metafórica.

“Portanto os simbolistas, compreendem que a poesia não é somente a emoção, amor, mas a tomada da consciência desta emoção; que a atitude poética não é unicamente afetiva, mas ao mesmo tempo cognitiva. Por outras palavras, a poesia carrega em si um modo de conhecer.” (MOISÉS, Massaud. História da Literatura Brasileira, Simbolismo. Pág: 35)


            A subjetividade de cada artista e seus aspectos não-racionais como o misticismo, também são valorizados e sobrepostos de acordo com alguns poetas que tinham uma estreita ligação nas artes plásticas, considerada Simbólicas já na França, destes; Verlaine, Mallarmé e Rimbaud.

Pode-se dizer então que, enquanto o Romantismo se eleva, o Simbolismo cai; queda esta que pode ser demonstrada pelas quebras dos padrões estéticos vivenciados cotidianamente em crise. Desta forma, a burguesia intelectual da época preconizavam o fim do academicismo e do positivismo, por terem a clareza de que esses valores não faziam mais sentido em suas vidas e, conseqüentemente, em suas criações. Deste modo, a obra começa a ser vista a partir de um novo olhar, a pintura é feita sem acabamento em sua superfície, com pinceladas toscas, distorções das formas e utilização de cores não naturais. Ou seja, a decadência superficial que recai sobre o materialismo, a terra. A própria linguagem a ser posta em questão e sendo mais trabalhada. A linguagem pela linguagem.
O mundo real, passa a ser transfigurado a partir daí. O Simbolismo rejeita toda aquela representação Fiel ao mundo, perfeitamente em traços. Com isso, toda essa idéia romântica do alcance a perfeição, a eterna busca pelo sublime recai, quando no Simbolismo essa transformação ocorre de forma lenta e gradual. A realidade passa a ser o plano teórico, um nível de abstração muito mais elevada, numa linguagem muito mais trabalhada e musicalizada, pois era a forma que os poetas encontravam para anular o tédio e representar o mundo de forma cientifica, material e orgânica.


“Após uma esfuziante crença na razão e na ciência, após tanto positivismo e tanto progresso teorizados, a prática da vida diária começou a mostrar ao homem finissecular em cansaço e uma descrença tão grande nesse mundo materialista, que uma espécie de nostalgia da alma do espírito, das coisas parecia dominar a todos.”
(PEIXOTO, Sérgio Alves. A consciência criadora na poesia brasileira; pág. 191)


O próprio Simbolismo nega os valores anteriores a ele, onde se encaixa o Romantismo, e é nesse conflito que o próprio poeta começa a questionar sua incapacidade de impor novos valores, e passa a negar o mundo e a realidade. Passa a descrê em tudo, buscando, sobretudo, na embriaguez e na musicalidade uma nova idéia que se transfigura. Nesse aspecto, podemos entrar agora com uma nova linha de estudo ao qual se encaixa o Romantismo de Segunda Geração, pois é a partir dele que podemos traçar um diálogo decadentista. Enquanto os poetas Simbolistas buscavam na embriaguez distorcer a realidade, e a descrença presente no próprio conflito interior, os poetas ultra-romanticos buscavam a embriaguez como forma de alcança aquilo que é perfeito, sendo assim numa posição contrária.

“Contatava-se a miséria do mundo e do poeta pra nada se fazer, a não ser lamentar-se, na maioria das vezes em tom baixo, e refugira-se na embriaguez do sonho e da música.”
(PEIXOTO, Sérgio Alves; A consciencia criadora na poesia brasileira; pág. 200)


É fato de que o Simbolismo apresenta traços meramente semelhantes ao de Romantismo de segunda geração, a que se baseou em uma arte totalmente voltada para o desapego patriota e “mergulhou” em um exacerbado sentimentalismo e pessimismo doentio como forma de escapar da realidade e dos problemas que assolavam a sociedade na época. Em síntese, pela cultura européia trazida pelo poeta Álvares de Azevedo, era o subjetivismo que assolava a obra poética do autor, o egocentrismo, e negação da cultura indianista, da cultura patriota, criando assim a necessidade do autor em se questionar sobre o seu papel dentro da literatura.
Sua poesia não revela nenhuma impregnação afetiva do instinto de nacionalidade que surgiu momentaneamente do subjetivismo lírico em que encontrava o clima ideal. Entre os românticos, foi de fato singular a sua atitude retraída perante a natureza, onde não encontrava resposta às solicitações do espírito. Álvares de Azevedo manifestava um regular desejo em conciliar-se com a natureza exterior.

São idéias talvez... Embora riam
Homens sem alma, estéreis criaturas,
Não posso desamar as utopias.”
(AZEVEDO, Álvares de, Lira dos vinte anos.)

A causa para o seu êxito como poeta, foi aquilo que dispunha como a natureza exterior: A sua imaginação de índole obscura, onde tudo era sugestivo em vida, mas que também era luminosidade, como o predomínio das forças elementares assim como relatadas posteriormente no Simbolismo.

“Quando Silvio Romero abusivamente o julgava um talento superior ao de Baudelaire ou quando Ronald de Carvalho entreviu, no poema “Meu sonho”, uma antecipação da poesia decadentista, é que , pela excentricidade de suas visões e pela fluidez de sua linguagem poética. Álvares de Azevedo fora mesmo alem do Romantismo convencional.”
(ROCHA, Hildon. Álvares de Azevedo: Anjo e Demônio do Romantismo, pág. XI)


Os simbolistas retomam a subjetividade da arte romântica com outro sentido. Os românticos desvendavam apenas a primeira camada da vida interior, onde se localizavam vivências quase sempre de ordem sentimental. Os simbolistas vão mais longe, descendo até os limites do subconsciente e mesmo do inconsciente. Cruz e Sousa têm por um de seus temas como principal, o luar, conciliando uma Síntese superior, a luz fria, a castidade e o lado noturno do seu “eu”. Este tema é apresentado por duas vias de acordo com Afrânio Coutinho: Ora a noite é acalentadora e que faz esquecer a maldade dos homens; ora é o símbolo da morte, da esterilidade. Sendo assim dispersos, ambas as escolas traçavam aquilo que era chamado de Decadentismo poético.

“O Decadentismo é um clima, é o extremo exacerbado individualismo, mais acentuado do que o Romantismo, é o cansaço de quem vive os últimos tempos, mas que ampliando-se ultrapassa seus limites históricos derramando-se pelo século XX. Com o Decadentismo, o lirismo pessoal readquire seu sentido puro.”


O Decadentismo presente no Simbolismo é diferente daquele encontrado no Romantismo, pois, vive exatamente na medida em que busca uma linguagem capaz de sugerir uma verdade, uma forma de recusar o mundo. Já que no Romantismo o decadentismo se dava aos encontros irrealizáveis do poeta que estavam sempre em plano irreal, imaterial. É sempre bom lembrar que o Decadentismo foi uma fase de negação, de protesto, de individualismo, de reação contra o Positivismo e Parnasianismo, reduzindo as suas emoções baixas, à emoções indefiníveis, as sensações exacerbadas, as “exigências” da carne.



Álvares de Azevedo, trouxe parcialmente ao Brasil essa reforma antinacionalista. Estudar a sua poesia é penetrar em um mundo cheio de sonhos e fantasias. Aceitar o desafio de penetrar a interioridade do poeta é descobrir que sua obra é a expressão do desejo de viver intensamente, retido por valores sociais que causando temor e anseios no poeta. O que se pode observar é que ele possui uma fascinação pelo novo, o que, de certa forma, dificultou a compreensão da crítica do século XIX, atribuindo a inovação a sua imaturidade, visto que boa parte de sua escrita está marcada pela rebeldia, própria de um poeta jovem que busca definir seu estilo.
Visto num contexto contra reformista em desordem social, tanto no Romantismo apresentado na Segunda Geração, como no Simbolismo, eis que surge uma vertente, uma leva tipicamente européia, trazida por influencias do Poeta Inglês George G. Byron, quando há uma penetração no satanismo surgido como oposição ao conceito religioso implementado na época. Satã realmente teve um papel fundamental na Literatura, pois era o mais belo do anjos, da luz. Satã foi símbolo da revolta e da liberdade entre a maioria dos poetas, sendo uma reivindicação de si mesmo perante a Deus. Em “broqueis” de Cruz e Sousa, a maioria dos poemas atualiza o amor erótico, o amor idealizado. O Amor em “faróis” é desmaterializado através do corpo que só se vislumbra com a morte e a destruição. A dor e a convulsa estão sempre presente nas obras do poeta.


“Existem em todo o homem, a todo o momento, duas postulações simultâneas, uma a Deus, outra a Satanás. A invocação a Deus, ou espiritualidade, é um desejo de elevar-se; aquela a Satanás, ou animalidade, é uma alegria de precipitar-se no abismo.”
(Charles Baudelaire)


Baudelaire, como sendo percussor do Simbolismo, opõe Deus ao maligno, e por ser cristão. Traz uma nostalgia da felicidade perdida, o corpo representa o pecado; o espírito representa o amor ideal. A putrefação encontra-se associado ao realismo mundano. Assim em Cruz e Sousa, “Vênus Negra” encaminha para o pecado, sensual e carnal por parte da mulher negra, enquanto a branca é alva e se encontra em uma atmosfera religiosa em grande parte dos poemas.

“Como os de hoje, os jovens daquele tempo, no Brasil provinciano e atrasado, faziam do sexo uma plataforma de libertação e combate, que se articulava à negação das instituições. Eles eram agressivamente eróticos, com a mesma truculência com que eram republicanos e agrediam o Imperador, chegando alguns ao limiar do socialismo. Portanto, foi um grande instrumento libertador esse Baudelaire unilateral ou deformado, visto por um pedaço, que fornecia descrições arrojadas da vida amorosa e favorecia uma atitude de oposição aos valores tradicionais, por meio de dissolventes como o tédio, a irreverência e a amargura.” (CANDIDO, 1987, p. 26)

Nessa leva influenciável, voltamos ao Byronismo, onde encontramos em Azevedo uma alma complexa de adolescente apaixonado pelo seu ídolo, fazendo de Byron o grande lírico, o poeta dos sonhos perdidos “Que do mundo o fingir merece apenas/ Negro sarcasmo em lábios de poeta”. Álvares de Azevedo transformou-o em sua própria musa, “Minha musa serás poeta altivo”, encontrando nele o espelho de seu dramatismo, pessimismo, desespero e descrença, fazendo da poesia uma explosão da alma irrequieta e melancólica.

Arquétipo

Ele era belo: na espaçosa fronte
O dedo do Senhor gravado havia
O sigilo do gênio; em seu caminho
O hino da manhã soava ainda
E os pássaros da selva gorjeando

Saudavam-lhe a passagem neste mundo.
Sim, era uma criança, e no entanto
Frio da morte lhe coava n´alma.
O seu riso era triste como o inverno,
Num clarão, nem um pálido lampejo
Da mocidade o fogo revelavam.

Em nada acreditava; há muito tempo
Que a idéia de Deus soprara d´alma
Como das botas a poeira incômoda.
O Evangelho era um livro de anedota,
Beethoven torturava-lhe os ouvidos
A poesia provocava o sono.

Muita donzela suspirou por ele,
Muita beleza lhe dormiu nos braços,
Mas frio como o gênio da descrença,
Após um´hora de gozar maldito,
Saciado as deixou, como o conviva
A mesa do festim, - farto e cansado...
(CAVALHEIRO, 1961, p. 18-19)


A consagração do fumo, da bebida, dos amores carnais e, principalmente o tédio, retratam uma concepção epicurista da vida; pois, a procura do prazer é uma necessidade transformada em uma verdadeira obsessão, tanto que a inexistência de um deleite obriga a substituição por outro cada vez mais eficiente. A produção Azevediana, à maneira de Byron é, contudo, a mais fraca e artificial.
A sua produção não-byroniana é excepcional pela dosagem exata do humor.
Magalhães Júnior (1962,p.46), em consonância com outros críticos, afirma que o mal byrônico foi uma epidemia que dominou as letras brasileiras:

“Morto aos 37 anos em 1824, duas décadas mais tarde Byron continuava a inflamar a mocidade intelectual brasileira. Quando acadêmico, em São Paulo, Antônio Augusto de Queiroga, seu primeiro tradutor no Brasil, transportara para a nossa língua o dramapoema Caim. Francisco José Pinheiro Guimarães traduzira ChildeHarold‟s Pilgrimage e outros estudantes procuravam fazer o mesmo. Raros os que, com algumas noções da língua inglesa e certa tendência literária, não pagavam seu tributo ao poeta de O Corsário e a Noiva de Abydos. José de Alencar foi um destes. Ele próprio o confessa em Como e porque sou romancista.” (Grifos do autor)


           Neste processo, podemos encaixar o poema “Lésbia” de Cruz e Sousa, publicado no livro “Broquéis”, de 1893,o poeta descreve uma figura feminina em que ressaltam aspectos selvagens e instintivos, pela aproximação direta com elementos do campo vegetal. O processo é intensificado pelos adjetivos que complementam aqueles elementos (lascivo, selvagem, mortal, carnívora e sangrenta),representando-se a sexualidade feminina, homossexual, como o título indica, de uma perspectiva negativa, também byronica. Os dois últimos tercetos acentuam a implícita aproximação ao satânico em referencia à demoníaca serpente, estabelecendo-se uma atmosfera de entorpecimento nasal pelos campos aromáticos, sabores em seios acídulos, amargos e visões obscuras como o luar tuberculoso. Observe o poema “Lésbia”:

Cróton selvagem, tinhorão lascivo,
Planta mortal, carnívora, sangrenta,
Da tua carne báquica rebenta
A vermelha explosão de um sangue vivo.

Nesse lábio mordente e convulsivo,
Ri, ri risadas de expressão violenta
O Amor, trágico e triste, e passa, lenta,
A morte, o espasmo gélido, aflitivo...

Lésbia nervosa, fascinante e doente,
Cruel e demoníaca serpente
Das flamejantes atrações do gozo.

Dos teus seios acídulos, amargos,
Fluem capros aromas e os letargos,
Os ópios de um luar tuberculoso..
(Lésbia – Cruz e Sousa)


(...) o terceiro, enfim, condensa-se nas lésbicas, por quem Baudelaire sempre se sentiu atraído, talvez devido a razões psicanalíticas profundas que não vale a pena investigar, mas que provavelmente se prendem com o repúdio da agressividade inerente ao falocentrismo da sexualidade masculina, deixando essas mulheres envoltas numa doçura que apenas o feminino conhece e que, sem o ônus da gravidez e da família, dão a Baudelaire a ilusão de um amor tanto mais puro quanto se libertou das leis da natureza.

                                                                                                          
            Enquanto o Romantismo prega o cansaço da civilização se apegando a um “Eu”, a uma “Pátria”, à “Religião” ou ao “Amor”, o Simbolismo expressa o mesmo cansaço, mas sem idealismos em que se apegar; só resta, para os simbolistas, a arte. Daí a idéia de “arte pela arte”. Além disso, diferentemente do Romantismo, na experiência simbolista toda transcendência está destinada ao fracasso. Trata-se de um mundo no qual não há mais Deus. A transcendência, assim, se volta para o mundo retificado, caracterizando uma busca do além pela concretude, configurando uma ambição um tanto quanto paradoxal. Outra diferença entre os movimentos é que enquanto o primeiro comunica, o último sugere, via o já explicado discurso indireto da imagem. Enquanto a figura de poeta no Romantismo é a de bardo, que transmite verdades, no Simbolismo a é figura de vidente - que vislumbra, entrevê.

          Visto que a literatura brasileira sofreu grande influência da literatura européia, nada mais natural que também nossos românticos e simbolistas se imbuíssem dessa influência. Assim como Cruz e Sousa tenha se banhado na poética orgânica de Baudelaire e Álvares de Azevedo na poética erótica de George G. Byron. Mesmo que a máscara satânica usada pelos poetas peca pela falsidade, os vícios que o escravizam não condizem com a realidade de ambos; Álvares de Azevedo morreu tão virgem quanto nasceu, e nisso Cruz e Souza vivia ao lado da Loucura de Gavita, sua esposa e na miséria, vendo distante dessa realidade tão almejada em seus poemas, a necessidade da eterna busca conflituosa e espirituosa.



Por: Valesca Rennó



domingo, 18 de agosto de 2013

Dr. Drauzio Varella fala sobre a questão do aborto




Queridos alunos de Produção de Texto.

Tendo em vista a correlação entre a revolta popular com a discussão da legalização do aborto e a repressão do mesmo, vale a pena assistir este vídeo para os ajudem no pré-conceito ao formar um novo ponto de vista nas redações de vocês. Lembrando que Enem visa um conhecimento amplo sobre o assunto e preza pela riqueza dos argumentos e do vocabulário culto.


" Desde que a pessoa tenha dinheiro para pagar, o aborto é permitido no Brasil. Se a mulher for pobre, porém, precisa provar que foi estuprada ou estar à beira da morte para ter acesso a ele. Como consequência, milhões de adolescentes e mães de família que engravidaram sem querer recorrem ao abortamento clandestino, anualmente.

A técnica desses abortamentos geralmente se baseia no princípio da infecção: a curiosa introduz uma sonda de plástico ou agulha de tricô através do orifício existente no colo do útero e fura a bolsa de líquido na qual se acha imerso o embrião. Pelo orifício, as bactérias da vagina invadem rapidamente o embrião desprotegido. A infecção faz o útero contrair e eliminar seu conteúdo.

O procedimento é doloroso e sujeito a complicações sérias, porque nem sempre o útero consegue livrar-se de todos os tecidos embrionários. As membranas que revestem a bolsa líquida são especialmente difíceis de eliminar. Sua persistência na cavidade uterina serve de caldo de cultura para as bactérias que subiram pela vagina, provoca hemorragia, febre e toxemia. A natureza clandestina do procedimento dificulta a procura por socorro médico, logo que a febre se instala. Nessa situação, a insegurança da paciente em relação à atitude da família, o medo das perguntas no hospital, dos comentários da vizinhança e a própria ignorância a respeito da gravidade do quadro colaboram para que o tratamento não seja instituído com a urgência que o caso requer.

A septicemia resultante da presença de restos infectados na cavidade uterina é causa de morte frequente entre as mulheres brasileiras em idade fértil. Para ter ideia, embora os números sejam difíceis de estimar, se contarmos apenas os casos de adolescentes atendidas pelo SUS para tratamento das complicações de abortamentos no período de 1993 a 1998, o número ultrapassou 50 mil. Entre elas, 3.000 meninas de dez a quatorze anos. Embora cada um de nós tenha posição pessoal a respeito do aborto, é possível caracterizar três linhas mestras do pensamento coletivo em relação ao tema.


Há os que são contra a interrupção da gravidez em qualquer fase, porque imaginam que a alma se instale no momento em que o espermatozoide penetrou no óvulo. Segundo eles, a partir desse estágio microscópico, o produto conceptual deve ser sagrado. Interromper seu desenvolvimento aos dez dias da concepção constituiria crime tão grave quanto tirar a vida de alguém aos 30 anos depois do nascimento. Para os que pensam assim, a mulher grávida é responsável pelo estado em que se encontra e deve arcar com as consequências de trazer o filho ao mundo, não importa em que circunstâncias.

No segundo grupo, predomina o raciocínio biológico segundo o qual o feto, até a 12ª semana de gestação, é portador de um sistema nervoso tão primitivo que não existe possibilidade de apresentar o mínimo resquício de atividade mental ou consciência. Para eles, abortamentos praticados até os três meses de gravidez deveriam ser autorizados, pela mesma razão que as leis permitem a retirada do coração de um doador acidentado cujo cérebro se tornou incapaz de recuperar a consciência.
Finalmente, o terceiro grupo atribui à fragilidade da condição humana e à habilidade da natureza em esconder das mulheres o momento da ovulação, a necessidade de adotar uma atitude pragmática: se os abortamentos acontecerão de qualquer maneira, proibidos ou não, melhor que sejam realizados por médicos, bem no início da gravidez.

Conciliar posições díspares como essas é tarefa impossível. A simples menção do assunto provoca reações tão emocionais quanto imobilizantes. Então, alheios à tragédia das mulheres que morrem no campo e nas periferias das cidades brasileiras, optamos por deixar tudo como está. E não se fala mais no assunto.

A questão do aborto está mal posta. Não é verdade que alguns sejam a favor e outros contrários a ele. Todos são contra esse tipo de solução, principalmente os milhões de mulheres que se submetem a ela anualmente por não enxergarem alternativa. É lógico que o ideal seria instruí-las para jamais engravidarem sem desejá-lo, mas a natureza humana é mais complexa: até médicas ginecologistas ficam grávidas sem querer.

Não há princípios morais ou filosóficos que justifiquem o sofrimento e morte de tantas meninas e mães de famílias de baixa renda no Brasil. É fácil proibir o abortamento, enquanto esperamos o consenso de todos os brasileiros a respeito do instante em que a alma se instala num agrupamento de células embrionárias, quando quem está morrendo são as filhas dos outros. Os legisladores precisam abandonar a imobilidade e encarar o aborto como um problema grave de saúde pública, que exige solução urgente."

- Dr. Drauzio Varella.

sábado, 17 de agosto de 2013



Traçando a cronologia da Gramática do Português

Séc V-IV a.C - Há uma unanimidade de historiadores da ciencia da linguagem sobre o que veio a constituir-se como gramática tradicional, origina-se em Platão e Aristóteles no corpo do seu pensar sobre o mundo.
Séc II - I a.C - Com Dionísio de Tracia traz a primeira descrição ampla e sistemática publicada no mundo ocidental de uma língua, o Grego da Ática, ou grego ático.
Séc II d.C - Apolônio Díscolo elaborou a primeira sintaxe ao estudar a lingua grega.
Séc II a.C - II d.C - Varrão (I a.C), aplicou a gramática grega á outra língua, o Latim.
Séc IV d.C - O gramático Donato apresenta uma minuciosa descrição das Letras em função da sua pronuncia, uma fonética, portanto enumerando os erros coerentes de seus alunos e já estabelece diferenças entre o Grego e o Latim.
Séc Vd.C - Em Priscinao se encontra a primeira Sintaxe da língua latina.
Séc. XVII - Com a gramática de Port Royal, se destingue as categorias linguisticas que subjazem as categorias lógicas, separando as formas de organização e pensamento de formas de organização das línguas.